segunda-feira, 13 de julho de 2009

Inveja?


23/08/04
Levei um tombo absurdo de patins que vai deixar um roxo enorme na minha bunda. Tombo de desenho animado, de filme de Jerry Lewis. Logo depois, uma mulher se retirou do rinque de patinação dizendo aos filhos:
— (...) essa mulher babaca se exibindo.
Fiquei muito puta, tirei meus óculos escuros e perguntei:
— Eu sou babaca por que ando de patins?
Ela me ignorou. Invejosa... Está com inveja do quê? Da minha bunda roxa? Porque para andar de patins como ando, meu amor, eu tive que cair muito. Não é colocar o pé e sair flutuando, não. A minha graça e habilidade foram à custa de muitos, muitos machucados. Essa é a metáfora. Ficar irada é uma bobagem, eu sei. Mas me faz pensar nos comentários que eventualmente recebo neste delicado fotolog. Anônimos resolvem opinar sobre minha vida. Acusando-me de falsa e achando muito bom quando cometo a desonra de confessar minhas tristezas publicamente. Bem feito, merecido?
Eu mereço mesmo. E se essa pessoa, ou pessoas me conhecessem saberiam que eu assumo cada passo, manobra, erro, nessa minha vida de meu deus... Porque eu me levanto só pra cair de novo, porque isso me dá graça aos movimentos e coragem de executar manobras arriscadas.
Começo a escrever esse texto num caderno que sempre carrego comigo. Daí um menino lindo, chamado Diogo, pé no chão, suado de brincadeiras, se aproxima de mim e pergunta:
— O que é isso? É dever?
Respondo que são meus pensamentos. Diz aí um pensamento seu para eu escrever, proponho.
— Não sei o que é pensamento, ele responde curioso.
— Eu explico... É o que se pensa, ué...
Interrompe cheio de orgulho, o amigo bem mais novo e já sai correndo continuando a brincadeira. Meu filho, que se chama Ian, estava dividindo seu skate com esses meninos, enquanto Diogo esperava sua vez, se aproxima de novo, vê meu desenho e pergunta:
— Foi isso que você pensou?
Provoquei de novo, diz aí um pensamento seu... Ele responde depressa:
— Um boneco.
Quando faltava só o cabelo ele tomou o caderno da minha mão e disse sorrindo:
— Vou desenhar o cabelo igual do Ian!
Minutos antes, seu amigo tinha dito “aquela menina”, se referindo a Ian, porque ele tem orgulhosos cabelos longos, Diogo retrucou:
— É um menino cara, só porque tem cabelo comprido? Vou deixar o meu crescer, diz passando a mão nos cabelos enroladinhos.
Depois pegou meu caderno para desenhar e disse que iria fazer uma águia, terminou o desenho lindo de morrer e perguntou:
— Tá bonito?
Fez outra águia, dessa vez cheia de corações:
— Tá parecendo uma águia?
Linda! Parecendo um pássaro, qualquer um, chocando um ovo. Assim são as crianças, não são invejosas. Ele é um pequeno menino, não tem um skate, precisa da generosidade do meu filho e das outras crianças, mas é feliz. Não diz que o cabelo do meu filho é feio porque ele quer ter um igual, ele diz:
— Eu vou ter um também.
Eu sorrio pra ele e nesse minuto não tenho problemas e tudo é felicidade. Somos todos divertidas crianças.


Tio Deleuze falando sobre Artaud e seu delicioso conceito do corpo sem órgãos. 

“O corpo sem órgãos é bloco de infância, devir, o contrário da recordação de infância. Ele não é criança “antes” do adulto, nem “mãe” “antes” da criança: ela é a estrita contemporaneidade do adulto, da criança e do adulto, seu mapa de densidades e intensidades comparadas, e todas as variações sobre esse mapa.”

Complicado? 

Eu digo, “diliça”.

3 comentários:

Além dos Números disse...

Linda Marcelle!!!!!!!!!!

Renato Zveiter Fuchshuber disse...

Realmente linda! Beijos nos dois!

Renato Zveiter Fuchshuber disse...
Este comentário foi removido pelo autor.